Em outubro e novembro, as comunidades dos municípios de Cajueiro da Praia (PI), Barroquinha e Chaval (CE) foram palco de discussão sobre propostas de ordenamento e zoneamento da pesca na região. Esses municípios fazem parte da porção leste da Área de Proteção Ambiental Delta do Parnaíba, nos estados do Maranhão, Piauí e Ceará. As propostas discutidas em diversas comunidades e apresentadas nas reuniões dos associados de três colônias de pescadores da área de influência dos rios Timonha e Ubatuba foram aprovadas por expressivo número de pescadores e marisqueiras.
Tudo começou no final de 2010 com o projeto “Encontros de Pesca dos rios Timonha e Ubatuba”, concebido e elaborado por analistas da APA Delta do Parnaíba e do Centro Mamíferos Aquáticos – CMA/PI, a partir do I Ciclo de Gestão Participativa e desenvolvido em parceria com as ONGs Comissão Ilha Ativa, do Piauí, e Aquasis, do Ceará. Produto final do projeto, a Carta-proposta dos Encontros de Pesca do Timonha e Ubatuba apresentou sugestões voltadas ao ordenamento e zoneamento da pesca, à pesquisa científica e ações que pudessem melhorar a renda e a vida dessas populações e diminuir a pressão sobre os recursos pesqueiros.
Um passo importante foi alcançado com a aprovação das propostas de ordenamento e zoneamento da atividade no estuário apresentadas na Carta-proposta. O acordo de pesca envolve três colônias de dois estados da federação e será comunicado às instituições competentes, entre elas, superintendências da pesca dos dois estados, Capitania dos Portos, governos estaduais e municipais e representações federativas da classe dos pescadores. Pelo acordo serão elaboradas normativas a serem instituídas, como a portaria da UC, outro passo fundamental na construção do plano de manejo da unidade.
Uma das mais importantes propostas aprovadas foi a decisão de criar área com restrições de pesca, um berçário de peixes, como está sendo chamado pelos pescadores. A Barra do Timonha, onde está localizado o berçário, é formada por dois canais de entrada com significativos “pesqueiros” – regiões com fundo de pedras, considerados importantes nichos de reprodução pelos pescadores – onde é muito praticado a pesca com linha. Além disso, é a porta de entrada do estuário, por onde os recursos pesqueiros entram para se alimentar e reproduzir, na opinião dos participantes dos encontros de pesca que construíram coletivamente a proposta.
Diante dessa percepção, pescadores limitaram o uso de petrechos como a “caçoeira” (rede de espera à deriva) e do espinhel (linha com grande quantidade de anzóis) na área do berçário. As artes de pesca permitidas são a linha (anzol simples), tarrafa e currais de pesca já existentes. Para monitorar os resultados da implantação do berçário, os participantes decidiram que deve haver avaliação durante o período de cinco anos. O acordo de pesca também inclui propostas de zoneamento da atividade para resolver conflitos de uso entre pescadores de técnicas de pesca diferentes e apresenta ainda demandas e orientações para a fiscalização do ICMBio, um desafio que precisa ser encarado diante do reduzido número de servidores da unidade.
No caminho da aprovação do acordo de pesca, foram realizadas reuniões nas comunidades de Coroa Grande (PI), Leitão e Chapada (CE), culminando este mês nas reuniões das colônias de cada município. Cerca de 400 participantes nas três reuniões realizadas referendaram a quase totalidade das propostas apresentadas.
Segundo equipe do CMA/PI, a responsabilidade do ICMBio é grande, pois a fiscalização da unidade precisa atuar com mais presença na região. “E se considerarmos o tamanho do estuário dos rios Timonha e Ubatuba na área total da APA Delta do Parnaíba veremos que o desafio é maior ainda, pois problemas como esses que existem no estuário são comuns em todo o Delta do Parnaíba”, explicaram os analistas.
O acordo de pesca do Timonha e Ubatuba tem grande importância em relação a outro aspecto, nem tão relacionado com a atividade pesqueira. Nesses rios, está presente significativa população de peixes-boi marinhos, que em época de inverno bom, com muita chuva, chegam a subir os rios até quase 15 km. Os pescadores dessas comunidades convivem pacificamente com essa espécie criticamente ameaçada de extinção e são aliados diretos quando o assunto é a pesca predatória ainda realizada nos rios e camboas, como a pesca com bomba, a batedeira, o arrasto e a tapagem de camboa. Essas técnicas de pesca proibidas, mas ainda realizadas, prejudicam tanto os peixes-boi como os usuários dos recursos pesqueiros. A fiscalização do ICMBio tem a missão de responder à altura as demandas apresentadas.
Materia publicada na edição 224 (30 de novembro de 2012) da Revista ICMBio em foco.
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